Esta semana um membro da minha
família decidiu que era hora de deixar de viver. Não sei quais demônios o
atormentavam, mas hoje isto é o que menos importa. Desde que soube da notícia
não foi exatamente nele que passei a pensar, nem nos porquês, mas vira e mexe
me pego pensando naqueles que ficaram.
Penso como cada um de nós passou
a semana processando a informação, pois apesar de tudo, as outras vidas devem
seguir. Não é assim? Pois bem, pensei na minha mãe sozinha em casa lá em
Salvador que me disse ter dito uma crise de choro, mas que depois “passou”. Penso
no meu primo que desta vez não estava lá, que desta vez não conseguiu
convencê-lo a ficar mais alguns momentos entre nós. Penso na minha tia, na dor
de uma mãe em ver o filho ir antes dela e naquelas circunstâncias... Não
consigo dimensionar o que ela está sentindo e nem quero ter esta pretensão, mal
consigo nomear o que se passa dentro de mim.
E é ai que paro para pensar em
mim, desde terça às duas e meia da tarde quando soube. Penso em todos os
sentimentos que habitaram o meu coração, a minha alma. O nó na garganta que
tratei de engolir até a hora de deixar o trabalho e vir para casa. Foram três
horas contendo uma louca vontade de sair andando sem rumo. Não era uma vontade de
correr, de gritar, era apenas uma vontade de me entregar à desorientação, de
sair por ai, reoxigenar, deixar a concentração de lado e me permitir sentir o
soco no estômago, o vazio que só veio me visitar durante as madrugadas, me
roubando aquilo, que quem me conhece sabe, me faz uma excelente companhia, o
sono.
Durante estas horas acordada,
fiquei pensando que nem éramos tão próximos assim, ele é filho da minha tia que
foi casada com o irmão da minha mãe. E mais, a última vez que o vi foi há quase
um ano atrás. No aniversário da minha mãe. Mas e daí? Criar este subterfúgio do
distanciamento para tentar me convencer de que eu não deveria sentir o que
sinto, só me fez ficar pior... Lembrei dele sorrindo no aniversário, reclamando
dos políticos, conversando com o meu pai, achando uma delícia aqueles petiscos
deliciosos e gordurosos que a gente se empanturra em aniversários. Lembrei que
em algum lugar existe uma fotografia deste aniversário e ele está nela.
Este ano não haverá fotografia,
muito menos aniversário. Mas estarei lá daqui 15 dias, olhando para minha mãe,
sem saber como dizer: “pode chorar mais, eu sei que ainda não passou”. Vou
olhar para o meu primo sabendo que ele não se conforma e que ele sim, ao
contrário de mim, soube pôr para fora tudo o que estava preso e ao invés de
dizer “você fez tudo o que pôde”, vou perguntar o que ele achou da nova camisa
do Flamengo. Para a minha tia quero
apenas não conseguir falar nada, será a melhor forma de respeito, dedicar o meu
silêncio pela incompreensão e deixá-la sofrer em paz, sem precisar usar a minha
polidez, a minha educação e dizer algo que soe como um sinto muito. Acho que
ninguém sente o suficiente...
E hoje, dentro da minha completa
falta de habilidade em consolar qualquer pessoa, inclusive a mim mesma, me
senti confortada e mais uma vez pelas manifestações artísticas, o meu lugar
favorito, onde sempre que preciso encontro refúgio e paz, nem que seja por
alguns minutos. E foi depois de assistir a Monsieur Lazhar que percebi que
precisava deixar sair tudo o está aqui dentro. Esta é a forma que sei fazer:
escrever. Sim, da minha forma confusa, entrecortada, mas que é a maneira que
muitas coisas que não compreendo acabam fazendo um pouco de sentido.
Que ele descanse em paz. Que eu
descanse em paz. Que todos nós descansemos em paz.